DISCURSO DO PAPA FRANCISCO
À DELEGAÇÃO DO PRÊMIO "É JORNALISMO"
Sábado, 26 de agosto de 2023
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Queridos amigos, bem-vindos!
Saúdo-vos e agradeço-vos por este encontro e pela atribuição do Prémio “É Jornalismo”. Deveis saber que eu, mesmo antes de ser Bispo de Roma, costumava recusar a oferta de prémios. Nunca os recebi, nunca os quis. E continuei a fazê-lo também como Papa. No entanto, há uma razão que me levou a aceitar o vosso, que é a urgência de uma comunicação construtiva, que promova a cultura do encontro, não do conflito; a cultura da paz, não da guerra; a cultura da abertura ao outro, não do preconceito. Todos vós sois ilustres representantes do jornalismo italiano. Permiti, então, que vos confie uma esperança e também que vos dirija francamente um pedido de ajuda. Mas não vos peço dinheiro, estai tranquilos!
A esperança é a seguinte: que hoje, numa época em que todos parecem comentar tudo, até independentemente dos acontecimentos e muitas vezes até antes de estar informados, redescubramos e voltemos cada vez mais ao cultivo do princípio de realidade — a realidade é superior à ideia, sempre — a realidade dos acontecimentos, o dinamismo dos eventos; que nunca são imóveis, evoluem sempre, para o bem ou para o mal, para não corrermos o risco de a sociedade da informação se transformar na sociedade da desinformação. A desinformação é um dos pecados do jornalismo, que são quatro: a desinformação, quando o jornalismo não informa ou informa mal; a calúnia (às vezes usa-se este termo); a difamação, que é diferente da calúnia, mas destrói; e o quarto é a coprofilia, ou seja, o amor pelo escândalo, pela sujidade, o escândalo vende. A desinformação é o primeiro dos pecados, dos erros — digamos assim — do jornalismo.
Mas para fazer isto devemos difundir uma cultura do encontro, uma cultura do diálogo, uma cultura da escuta do outro e das suas razões. A cultura digital trouxe-nos tantas novas possibilidades de intercâmbio, mas também corre o risco de transformar a comunicação em slogan . Não, a comunicação é sempre ida e volta. Digo, ouço e respondo, mas sempre em diálogo. Não se trata de slogan . Preocupam-me, por exemplo, as manipulações daqueles que, de forma interesseira, propagam fake news para influenciar a opinião pública. Por favor, não cedamos à lógica da oposição, não nos deixemos influenciar pela linguagem do ódio. Na conjuntura dramática que a Europa vive, com a continuação da guerra na Ucrânia, somos chamados a um sobressalto de responsabilidade. Espero que se dê espaço às vozes de paz, a quem está comprometido em pôr fim a este e a muitos outros conflitos, àqueles que não se rendem à lógica “cainista” da guerra, mas continuam a acreditar, apesar de tudo, na lógica da paz, na lógica do diálogo, na lógica da diplomacia.
E agora, o pedido de ajuda. Precisamente neste tempo, em que se fala muito e se ouve pouco, e em que o sentido do bem comum corre o risco de se debilitar, toda a Igreja empreendeu um caminho para redescobrir a palavra juntos . Devemos redescobrir a palavra juntos . Caminhar juntos . Questionar-nos juntos . Assumir juntos o discernimento comunitário, que para nós é oração, como fizeram os primeiros Apóstolos: é a sinodalidade , que gostaríamos de tornar um hábito diário em todas as suas expressões. Precisamente com este objetivo, daqui a pouco mais de um mês, bispos e leigos do mundo inteiro reunir-se-ão aqui em Roma para um Sínodo sobre a sinodalidade: escutar juntos , discernir juntos , rezar juntos . A palavra juntos é muito importante. Vivemos numa cultura da exclusão, que é uma espécie de capitalismo da comunicação. Talvez a prece habitual desta exclusão seja: “Obrigado, Senhor, porque não sou como este, não sou como aquele, não sou...”: excluem-se. Devemos dar graças ao Senhor por tantas coisas boas!
Compreendo muito bem que falar de “Sínodo sobre a sinodalidade” pode parecer algo ilógico, autorreferencial, excessivamente técnico, de pouco interesse para o público em geral. Mas o que aconteceu no ano passado, que continuará com a assembleia de outubro próximo e depois com a segunda etapa do Sínodo 2024 , é algo verdadeiramente importante para a Igreja. É um caminho que começou com São Paulo VI, no final do Concílio, quando criou o Secretariado para o Sínodo dos Bispos, porque tinha entendido que na Igreja ocidental a sinodalidade desaparecera, ao passo que na Igreja oriental existe esta dimensão. E este caminho de tantos anos — 60 anos — dá grandes frutos. Por favor, habituemo-nos a ouvir-nos uns aos outros, a falar, a não cortar a cabeça por uma palavra. Escutar, discutir de forma madura. É uma graça de que todos precisamos para progredir. É algo que a Igreja de hoje oferece ao mundo, um mundo muitas vezes tão incapaz de tomar decisões, até quando a nossa sobrevivência está em jogo. Procuramos aprender uma nova forma de viver as relações, escutando-nos uns aos outros, para ouvir e seguir a voz do Espírito. Abrimos as nossas portas, oferecemos a todos a oportunidade de participar, tendo em consideração as exigências e sugestões de todos. Queremos contribuir juntos para construir a Igreja onde todos se sintam em casa, onde ninguém seja excluído. Aquela palavra do Evangelho, que é tão importante: todos. Todos, todos: não há católicos de primeira, segunda ou terceira classe, não! Todos juntos. Todos! É o convite do Senhor.
Por isso, ouso pedir a vossa ajuda, mestres de jornalismo: ajudai-me a narrar este processo tal como ele é, saindo da lógica dos slogans e das histórias preconcebidas. Não, a realidade! Alguém dizia: “A única verdade é a realidade”. Sim, a realidade! Todos beneficiaremos com isso e, tenho a certeza, isto também “é jornalismo”!
Caros amigos, mais uma vez obrigado por este encontro, pelo que ele significa em referência ao nosso compromisso comum pela verdade e pela paz. Confio todos vós à intercessão de Maria e recomendo-vos: não vos esqueçais de rezar por mim!
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