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VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA FRANCISCO
AO REINO DO BAHREIN

por ocasião do "Bahrain Forum for Dialogue: East and West for Human Coexistence"
(3 - 6 DE NOVEMBRO DE 2022)

ENCONTRO COM AS AUTORIDADES, COM A SOCIEDADE CIVIL E COM O CORPO DIPLOMÁTICO

DISCURSO DO SANTO PADRE

Awali
Quinta-feira, 3 de novembro de 2022

[Multimídia]

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Majestade,
Altezas Reais,
Ilustres membros do Governo e do Corpo Diplomático,
Distintas Autoridades religiosas e civis,
Senhoras e Senhores,
As-salamu alaikum [A paz esteja convosco]!

De coração agradeço a Sua Majestade o amável convite para visitar o Reino do Bahrein, o caloroso e generoso acolhimento e as palavras de boas-vindas que me dirigiu. Saúdo cordialmente a cada um de vós. Desejo manifestar a minha calorosa estima a quantos vivem neste país: a cada crente, a cada pessoa e a cada família, que a Constituição do Bahrein define «pedra angular da sociedade». A todos expresso a minha alegria por me encontrar no vosso meio.

Aqui, onde as águas do mar circundam as areias do deserto e imponentes arranha-céus se erguem ao lado dos tradicionais mercados orientais, cruzam-se realidades muito diferentes: convergem antiguidade e modernidade, fundem-se história e progresso, e sobretudo pessoas da mais variada proveniência formam um original mosaico de vida. Ao preparar-me para esta viagem, tomei conhecimento dum «emblema de vitalidade» que carateriza o país; refiro-me à chamada «árvore da vida» (Shajarat-al-Hayat), à qual desejo inspirar-me ao partilhar convosco algumas ideias. Trata-se duma majestosa acácia, que, há séculos, sobrevive numa zona deserta, onde a chuva é muito escassa. Parece impossível que uma árvore tão longeva resista e prospere em tais condições. Na opinião de muitos, o segredo estaria nas raízes, que se estendem por dezenas de metros sob o solo, bebendo em depósitos subterrâneos de água.

As raízes! O Reino do Bahrein empenha-se na pesquisa e valorização do seu passado, que fala duma terra extremamente antiga, para onde, já há milénios, acorriam os povos, atraídos pela sua beleza, resultante em particular das abundantes nascentes de água doce que lhe deram a fama de ser paradisíaca: o antigo reino de Dilmun denominava-se «terra dos vivos». Remontando no tempo até às suas raízes (conta 4500 anos de presença humana ininterrupta), resulta terem sido a posição geográfica, a propensão e a habilidade comercial do povo, bem como certas vicissitudes históricas que permitiram ao Bahrein moldar-se como encruzilhada de mútuo enriquecimento entre os povos. De facto, um aspeto sobressai nesta terra: sempre foi lugar de encontro entre populações diferentes.

Está aqui a água vital, aonde vão ainda hoje beber as raízes do Bahrein, cuja maior riqueza se vê na sua variedade étnica e cultural, na convivência pacífica e no tradicional acolhimento da população. Uma diversidade, não homogeneizadora, mas inclusiva constitui o tesouro de qualquer país verdadeiramente evoluído. E, nestas ilhas, pode-se admirar uma sociedade mista, multiétnica e multirreligiosa, que foi capaz de superar o perigo do isolamento. Isto é muito importante no nosso tempo, cujo excludente retraimento em si mesmo e nos próprios interesses impede de captar a irrenunciável importância do todo. Diversamente os numerosos grupos nacionais aqui coexistentes, étnicos e religiosos, testemunham que se pode e deve conviver no nosso mundo; este, já há decénios que se tornou uma aldeia global, mas, dando-se por suposta a globalização, ainda desconhece «o espírito da aldeia» em várias das suas vertentes: a hospitalidade, a solicitude pelo outro, a fraternidade. Pelo contrário, assistimos, preocupados, ao crescimento em larga escala da indiferença e mútua suspeita, à extensão de rivalidades e contraposições que se esperavam superadas, a populismos, extremismos e imperialismos que põem em perigo a segurança de todos. Não obstante o progresso e tantas conquistas civis e científicas, aumenta a distância cultural entre as várias partes do mundo e, às benéficas oportunidades de encontro, antepõem-se perversas atitudes de conflito.

Em vez disso, pensemos na árvore da vida – o vosso símbolo – e distribuamos, nos desertos áridos da convivência humana, a água da fraternidade: não deixemos evaporar-se a possibilidade do encontro entre civilizações, religiões e culturas, não permitamos que sequem as raízes do humano! Trabalhemos juntos, trabalhemos a bem do todo, em prol da esperança! Estou aqui, na terra da árvore da vida, como semeador de paz, para viver dias de encontro, participar num Fórum de diálogo entre Oriente e Ocidente em prol da coexistência humana pacífica. Desde já agradeço aos companheiros de viagem, especialmente aos Representantes religiosos. Estes dias marcam uma etapa preciosa no percurso de amizade que tem vindo a intensificar-se, nos últimos anos, com vários líderes religiosos islâmicos: um caminho fraterno que, sob o olhar do Céu, quer favorecer a paz na Terra.

A propósito, manifesto o meu apreço pelas conferências internacionais e as oportunidades de encontro que este Reino organiza e favorece, centrando-se especialmente na temática do respeito, da tolerância e da liberdade religiosa. São pontos essenciais, reconhecidos pela Constituição do país, onde se estabelece que «não deve haver discriminação alguma com base no sexo, na proveniência, na língua, na religião ou no credo» (art. 18), que «a liberdade de consciência é absoluta» e que «o Estado tutela a inviolabilidade do culto» (art. 22). Trata-se sobretudo de compromissos que hão de traduzir-se constantemente na prática, para que a liberdade religiosa se torne plena, não se limitando à liberdade de culto; para que igual dignidade e paridade de oportunidades sejam reconhecidas concretamente a todo o grupo e a toda a pessoa; para que não haja discriminações e os direitos humanos fundamentais não sejam violados, mas promovidos. Penso, antes de mais nada, no direito à vida, na necessidade de o garantir sempre, mesmo em relação a quem é punido, cuja existência não pode ser eliminada.

Voltemos à árvore da vida. Os múltiplos ramos de diferente tamanho que a caraterizam, com o passar do tempo, deram vida a espessas ramagens, fazendo crescer a sua altura e circunferência. Neste país, foi precisamente a contribuição de tantas pessoas de diferentes povos que consentiu um notável progresso produtivo. Isto tornou-se possível graças à imigração, que regista no Reino do Bahrein uma das taxas mais elevadas do mundo: cerca de metade da população residente é estrangeira e trabalha de forma significativa para o progresso dum país, onde – tendo deixado a própria pátria – se sente em casa. Todavia não se pode esquecer que, nos nossos dias, há ainda muita falta de trabalho e demasiado trabalho desumano: isto acarreta não só graves riscos de instabilidade social, mas representa um atentado à dignidade humana. De facto, o trabalho não é necessário apenas para se ganhar a vida, mas constitui também um direito indispensável para nos desenvolvermos integralmente a nós próprios e moldarmos uma sociedade à medida do homem.

A partir deste país, atraente pelas oportunidades laborais que oferece, quero lembrar a emergência da crise laboral mundial: muitas vezes falta o trabalho, precioso como o pão; frequentemente é pão envenenado, porque escraviza. Em ambos os casos, no centro já não está o homem, que, de fim sagrado e inviolável do trabalho, acaba reduzido a um meio para produzir dinheiro. Assim, por todo o lado, sejam garantidas condições laborais seguras e dignas do homem, que não impeçam, mas favoreçam a vida cultural e espiritual; que promovam a coesão social, em proveito da vida comum e do próprio progresso dos países (cf. Conc. Ecum. Vat. II, Const. past. Gaudium et spes, 9.27.60.67).

O Bahrein pode gloriar-se de preciosas conquistas neste sentido: penso, por exemplo, na primeira escola feminina surgida no Golfo e na abolição da escravatura. Continue a ser farol na promoção em toda a área dos direitos e condições équas e cada vez melhores para os trabalhadores, as mulheres e os jovens, garantindo ao mesmo tempo respeito e solicitude por quantos se sentem mais à margem da sociedade, como os migrantes e os reclusos: o desenvolvimento verdadeiro, humano, integral mede-se sobretudo pela atenção que lhes é prestada.

A árvore da vida, que se ergue, solitária, na paisagem desértica, sugere-me ainda dois âmbitos decisivos para todos e que interpelam primariamente quem, governando, detém a responsabilidade de servir o bem comum. Em primeiro lugar, a questão ambiental: quantas árvores são derrubadas, quantos ecossistemas devastados, quantos mares poluídos pela ganância insaciável do homem, cuja conta se deve pagar depois! Não nos cansemos de trabalhar em prol desta dramática pendência, realizando opções concretas e previdentes, feitas a pensar nas gerações mais jovens, antes que seja demasiado tarde e se comprometa o seu futuro. Que a Conferência das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas (COP27), que terá lugar no Egito dentro de poucos dias, constitua um passo em frente no referido sentido!

Em segundo lugar, a árvore da vida com as suas raízes, que, do subsolo, comunicam a água vital ao tronco e, deste, aos ramos e sucessivamente às folhas, que dão oxigénio às criaturas, faz-me pensar na vocação do homem, de todo o homem que está na terra: fazer a vida prosperar. Entretanto assistimos hoje, e cada dia sempre mais, a ações e ameaças de morte. De modo particular estou a pensar na realidade monstruosa e insensata da guerra, que semeia por toda a parte destruição e erradica a esperança. Na guerra, aparece o lado pior do homem: egoísmo, violência e mentira. Sim, porque a guerra, qualquer guerra, constitui também a morte da verdade. Rejeitemos a lógica das armas e invertamos o rumo, transformando as enormes despesas militares em investimentos para combater a fome, a falta de cuidados sanitários e de instrução. Tenho no coração a tristeza por tantas situações de conflito. Olhando para a Península Arábica, cujos países desejo saudar com cordialidade e respeito, dirijo um pensamento especial e sentido ao Iémen, martirizado por uma guerra esquecida que, como qualquer guerra, não leva a nenhuma vitória, mas apenas a amargas derrotas para todos. Recordo na oração sobretudo os civis, as crianças, os idosos, os doentes, e imploro: calem-se as armas, calem-se as armas, calem-se as armas! Empenhemo-nos por toda parte e de verdade em prol da paz!

A respeito disto, a Declaração do Reino do Bahrein reconhece que a fé religiosa é «uma bênção para todo o género humano», o alicerce «para a paz no mundo». Estou aqui como crente, como cristão, como homem e peregrino da paz, porque hoje, mais do que nunca, somos chamados a empenhar-nos seriamente, por todo o lado, em prol da paz. Assim, Majestade, Altezas Reais, Autoridades, Amigos, faço meu e partilho convosco, como desejo para estes anelados dias de visita ao Reino do Bahrein, um belo trecho da própria Declaração: «Empenhamo-nos a trabalhar por um mundo, onde as pessoas de credo sincero se unam entre si para rejeitar aquilo que nos divide e, ao contrário, escolher aquilo que nos une». Assim seja, com a bênção do Altíssimo! Shukran [obrigado]!



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