CELEBRAÇÃO MATUTINA TRANSMITIDA AO VIVO
DA CAPELA DA CASA SANTA MARTA
HOMILIA DO PAPA FRANCISCO
"Deus sempre age na simplicidade"
Segunda-feira, 16 de março de 2020
Introdução à Santa Missa
Continuemos a rezar pelos doentes. Penso nas famílias, fechadas em casa, nas crianças que não vão à escola, nos pais que talvez não possam sair; alguns estarão em quarentena. Que o Senhor os ajude a descobrir novos modos, novas expressões de amor, de convivência nesta nova situação. É uma ocasião bela para reencontrar os verdadeiros afetos, com a criatividade em família. Rezemos pela família, para que as relações na família neste momento floresçam sempre para o bem.
Homilia
Em ambos os textos que hoje a Liturgia nos leva a meditar, há uma atitude que chama a atenção, uma atitude humana, mas não de bom espírito: a indignação. Este povo de Nazaré começou a ouvir Jesus, gostava do modo como Ele falava, mas depois alguém disse: “Mas este aí estudou em qual universidade? Este é o filho de Maria e José, este é o carpinteiro! O que nos vem dizer?”. E o povo indignou-se. Entram nesta indignação. E essa indignação leva-os à violência. E aquele Jesus que admiravam no início da pregação é levado para fora da cidade, para o lançar do alto do monte.
Também Naamã, que era um homem bom, inclusive aberto à fé, mas quando o profeta lhe manda banhar-se no Jordão, indigna-se. Mas como é possível? “Eu pensava que ele viria pessoalmente e, diante de mim, invocaria o Senhor, seu Deus, poria a mão no lugar infetado e curar-me-ia da lepra. Porventura os rios de Damasco, o Abana e o Farfar, não são melhores que todas as águas de Israel? Não me poderia eu lavar neles e ficar limpo? E, voltando-se, retirou-se encolerizado”. Com indignação.
Também em Nazaré há pessoas boas; mas o que há por trás destas boas pessoas que as leva a essa atitude de indignação? E em Nazaré é pior: a violência. Quer as pessoas da sinagoga de Nazaré, quer Naamã pensavam que Deus se manifestasse somente no extraordinário, nas coisas fora do comum; que Deus não podia agir nas coisas comuns da vida, na simplicidade. Indignavam-se com o simples. Eles indignavam-se, desprezavam as coisas simples. E o nosso Deus faz-nos entender que Ele age sempre na simplicidade: na simplicidade, na casa de Nazaré, na simplicidade do trabalho de todos os dias, na simplicidade da oração... As coisas simples. Ao contrário, o espírito mundano leva-nos à vaidade, às aparências...
E ambas acabam na violência: Naamã é muito educado, mas bate a porta diante do profeta e vai embora. A violência, um gesto de violência. O povo da sinagoga começa a irritar-se, a acalorar-se, e toma a decisão de assassinar Jesus, mas inconscientemente, e expulsam-no para o lançar do alto do monte. A indignação é uma tentação terrível, que leva à violência.
Dias atrás, mostraram-me num telefone celular um vídeo da porta de um prédio em quarentena. Havia uma pessoa, um jovem, que queria sair. E o guarda disse-lhe que não podia. Ele reagiu com socos, com indignação, com desprezo. “Mas quem és tu, ‘negro’, para impedir que eu saia?”. A indignação é a atitude dos soberbos, mas dos soberbos pobres, dos soberbos com uma terrível pobreza de espírito, dos soberbos que vivem somente com a ilusão de ser mais do que realmente são. É uma estratificação espiritual, o povo que se indigna: aliás, estes indivíduos sentem a necessidade de se indignar muitas vezes para se sentir pessoas.
Isto pode acontecer também com cada um de nós: “o escândalo farisaico”, chamam-lhe os teólogos, escandalizar-me com coisas que são a simplicidade de Deus, a simplicidade dos pobres, a simplicidade dos cristãos, como se dissesse: “Mas isso não é Deus. Não, não! O nosso deus é mais culto, é mais sábio, é mais importante. Deus não pode agir nesta simplicidade”. E a indignação leva-nos sempre à violência, quer à violência física, quer à dos mexericos, que mata como a violência física.
Pensemos nestas duas passagens: a indignação do povo na sinagoga de Nazaré e a indignação de Naamã, porque não entenderam a simplicidade do nosso Deus.
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