PAPA FRANCISCO
MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA
NA CAPELA DA CASA SANTA MARTA
Três grupos de insensatos
Terça-feira, 17 de outubro de 2017
Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 43 de 26 de outubro de 2017
«O caminho da insensatez leva à corrupção»: foi o ensinamento que o Papa extraiu das leituras litúrgicas.
Francisco no início observou que «na liturgia da palavra de hoje o termo “insensato” é mencionado duas vezes. Jesus que a pronuncia aos doutores da lei, a alguns fariseus (Lc 11, 37-41); e Paulo que a dirige aos pagãos: “Considerando-se sábios, tornam-se insensatos” (Rm 1, 16-25)». Francisco quis acrescentar um terceiro caso: Paulo dirigiu-se também aos Gálatas, definindo-os «“insensatos” porque se deixaram enganar, encantar pelas novas ideias». Consequentemente, «esta palavra dirigida aos doutores da lei, dita aos pagãos e aos cristãos que se deixam encantar pelas ideologias, é uma condenação». Ou melhor, esclareceu o Papa, «mais do que uma condenação é uma indicação, porque mostra o caminho da insensatez: que leva à corrupção».
A propósito, o Pontífice indicou «três grupos de insensatos» que «são corruptos». Antes de tudo, os doutores da lei e os fariseus, aos quais «Jesus disse: “sois semelhantes a sepulcros caiados”: por fora parecem bonitos, mas por dentro estão cheios de ossos e de podridão. Corruptos». Em segundo lugar os pagãos, que acusados por «Paulo, na leitura de hoje», por «se terem tornado insensatos», «trocando a glória de Deus incorruptível com uma imagem e uma figura de homem corruptível, de pássaros, de quadrúpedes... Por isso Deus abandonou-os à impuridade, segundo os desejos do seu coração». Em síntese, também neste caso, «há a corrupção», precisamente como os doutores da lei citados precedentemente que «se tornaram corruptos só para evidenciar a aparência e não o que são dentro. Corrompidos pela vaidade, pela aparência, pela beleza exterior, pela justiça exterior. Tornaram-se corruptos porque só se preocupavam em limpar, em embelezar o exterior das coisas, não iam dentro, onde estava a corrupção. Como nos sepulcros». Portanto, prosseguiu o Papa na comparação, «estes pagãos tornaram-se corruptos porque trocaram a glória de Deus, que teriam conhecido através da razão, pelos ídolos: a corrupção da idolatria, de muitas idolatrias». E, advertiu a propósito Francisco, «não só as idolatrias dos tempos antigos, também as de hoje: por exemplo, a idolatria do consumismo; de procurar um deus cómodo».
Por fim o terceiro caso, dos Gálatas, «aos quais Paulo disse o mesmo», porque «se deixaram corromper pelas ideologias: deixaram de ser cristãos para se tornarem ideólogos do cristianismo». Contudo, foi a conclusão do Pontífice, «as três» categorias «acabam na corrupção, devido à insensatez».
Eis então a exortação a perguntar-se: «No que consiste esta insensatez?». E a primeira resposta do Papa foi «é um não ouvir; literalmente pode-se dizer um “néscio”, “não sabe”, não ouve. A incapacidade de ouvir a Palavra: quando a Palavra não entra, não a deixo entrar porque não a ouço. O insensato não ouve. Ele pensa que ouve mas não escuta. Age por si mesmo, sempre. E por isso a palavra de Deus não pode entrar no coração e não tem lugar para o amor». Ou no limite, e este é um caso bastante comum, a Palavra «entra mas é destilada, transformada pela minha conceção da realidade».
Portanto, Francisco retomou o raciocínio, «os insensatos não sabem ouvir. E esta surdez leva-os à corrupção. A palavra de Deus não entra, não tem lugar para o amor e por fim nem para a liberdade». E sobre este aspeto «Paulo é claro: tornam-se escravos. “Por isso Deus, segundo os desejos dos seus corações, os entregou à impureza, a fim de que neles se degradassem os próprios corpos”. Porquê? Porque trocaram a verdade de Deus com a mentira, e adoraram e serviram as criaturas e não o Criador. Não são livres, e o não ouvir, esta surdez não deixa espaço para o amor nem para a liberdade: leva sempre a uma escravidão».
Por conseguinte seria oportuno, sugeriu o Papa, interrogarmo-nos: «Ouço a palavra de Deus? Deixo-a entrar? Esta palavra, que ouvimos entoando o Aleluia, a palavra de Deus é viva, eficaz, discerne os sentimentos e os pensamentos do coração. Comove, penetra. Deixo entrar esta palavra ou fico surdo? Transformo-a em aparência, em idolatria, hábitos idolátricos ou transformo-a em ideologia? E não entra». Porque, advertiu o Pontífice, «esta é a insensatez dos cristãos».
Por fim Francisco exortou a dar um ulterior passo, isto é, «assim como os ícones dos santos nos fazem tão bem», hoje deveríamos «olhar para o ícone dos insensatos». E, garantiu, «há muitos». «Há cristãos insensatos e até pastores insensatos»: aqueles que, recordou o Papa, «Santo Agostinho repreende com vigor. Porque a insensatez dos pastores prejudica o rebanho: quer a insensatez do pastor corrompido, a insensatez do pastor satisfeito consigo mesmo, pagão, quer a insensatez do pastor ideólogo».
Eis então a recomendação final do Pontífice: «Olhemos para o ícone dos cristãos insensatos e ao lado desta insensatez olhemos para o Senhor que está sempre à porta: bate à porta e espera». Praticamente trata-se de pensar «na nostalgia do Senhor, quando recorda os bons tempos: “Recordo-me de ti desde os tempos da tua juventude, desde o tempo do amor, do teu noivado, quando me seguias no deserto, em terras não semeadas”. Esta nostalgia de Deus, do primeiro amor que teve connosco». De facto «se cairmos nesta insensatez e nos afastarmos, ele sente nostalgia. Nostalgia de nós». A ponto que «Jesus, por causa desta nostalgia chorou, chorou sobre Jerusalém: era a nostalgia de um povo que ele escolheu, amou, mas que se afastou por insensatez; preferiu as aparências, os ídolos ou as ideologias».
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