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PAPA FRANCISCO

MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA
NA CAPELA DA CASA SANTA MARTA

A graça do arrependimento

Sexta-feira, 6 de outubro de 2017

 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 42 de 19 de outubro de 2017

O nosso «primeiro nome é “pecador”». Por isso «peçamos ao Senhor a graça de nos envergonharmos» diante de Deus omnipotente que «nos abraça» com toda a sua misericórdia. Hoje, «o profeta Baruc indica-nos o caminho certo para pedir perdão», afirmou o Papa Francisco em Santa Marta.

Com efeito, «a primeira leitura é um ato de arrependimento» observou referindo-se precisamente ao trecho do livro de Baruc (1, 15-22). «O povo arrepende-se diante do Senhor e pede perdão pelos seus pecados: arrepende-se olhando para a glória do Senhor e para as más ações que cometeu». E «o trecho do profeta Baruc começa assim: “Para vós, Senhor, a justiça” porque Ele é justo e “para nós, porém, a vergonha”».

Portanto, «sentem-se assim e com este coração pedem perdão». E «não dizem “fizemos isto e aquilo...”: o que sempre fizeram, dizem-nas em relação ao Senhor, diante do Senhor». E «esta é a maneira de se arrependerem: todo o povo se arrependeu, naquele momento, e pediu perdão por todos “os habitantes de Jerusalém, pelos nossos reis e chefes, pelos nossos sacerdotes e profetas e pelos nossos pais, porque pecamos contra o Senhor”».

«Isto significa que todos somos pecadores, todos», afirmou Francisco. A ponto que «ninguém pode dizer “eu sou justo” ou “eu não sou como aquele ou aquela”». Mas antes reconhecer que «eu sou pecador». E «eu diria que é quase o primeiro nome que todos temos: pecadores» afirmou o Papa, questionando a seguir: «Por que somos pecadores? Desobedecemos, sempre em relação com o Senhor: ele disse uma coisa e nós fizemos outra; não ouvimos a voz do Senhor: ele falou-nos tantas vezes». Com efeito, insistiu, «na nossa vida cada um pode pensar: “quantas vezes o Senhor se dirigiu a mim, quantas vezes não o ouvi!”». Por exemplo, prosseguiu, «falou com os pais, com a família, com o catequista, na igreja, nas pregações, e também no nosso coração: ouvimos a voz do Senhor» mas «não ouvimos aquela voz que nos dizia para “caminhar segundo os decretos” que ele dera».

Lê-se ainda no excerto de Baruc proposto pela liturgia: «Nós nos rebelamos ao Senhor nosso Deus». E «o pecado é sempre o mesmo» porque «o pecado isolado não existe». Pois «o pecado é sempre pecado porque está em relação com Deus». Aliás, explicou o Pontífice, «o pecado isolado» está «descrito nos livros mas, na vida, um pecado é sempre uma má ação diante de Deus, na relação com ele». E assim, prosseguiu o Papa retomando as palavras do trecho de Baruc, «rebelamo-nos» a ele, «obstinamo-nos a não ouvir a sua voz»: eis «a obstinação do coração».

«Eu penso — confidenciou Francisco — que o profeta nos ensina como nos arrependermos; ensina-nos qual é o caminho para pedir perdão, o verdadeiro caminho». Baruc escreve que «com o pecado caíram-nos em cima muitos males»: e isto «porque — observou o Papa — o pecado arruína, arruína o coração, a vida, a alma; debilita, faz adoecer». Lê-se ainda no trecho de Baruc: «Não ouvimos a voz do Senhor» e, aliás, «em vez de ouvir o Senhor “seguiu as inclinações pervertidas do seu coração, serviu estrangeiros e praticou o que é mal aos olhos do Senhor”».

Em síntese, afirmou o Pontífice, «o Senhor falou-nos» mas «cada um de nós fez o contrário: caiu na idolatria, as pequenas idolatrias de cada dia, fez o que é mau aos olhos do Senhor e seguiu “as inclinações pervertidas do coração”».

«Nós sabemos — disse sugerindo que se faça uma reflexão pessoal — que no nosso coração há muitas vezes inclinações para os pecados: avidez, inveja, ódio, calúnias». E «pensemos» precisamente nas «calúnias: talvez vós não — não sei — mas quantas vezes eu falo mal dos outros? Quantas vezes caluniei?». As calúnias, com efeito, são uma inclinação do coração: arruinar a vida do próximo». Ou pior: «Nós arrancamos as vestes quando ouvimos as notícias das guerras, mas falar mal é uma guerra, é uma guerra do coração para destruir o outro». E quando «o Senhor nos diz: “não, não fales mal, fica calado”», ao contrário «eu faço o que quero».

Por conseguinte, é importante «olhar sempre para o pecado nesta relação com o Senhor que nos ama, nos dá tudo», mesmo se «nós fazemos o que queremos». Por este motivo, sugeriu ainda, «quando fazemos o exame de consciência ou nos preparamos para a confissão, não devemos só enumerar os pecados, como se fossem as páginas amarelas ou a lista das compras: não». É preciso ao contrário reconhecer «este pecado que cometi diante do Senhor: ter sempre presente a relação: “eu fiz isto diante de ti”».

Muitas vezes, observou, «vamo-nos confessar com a lista dos pecados — maus, é verdade — e despejamos ali tudo diante do sacerdote, e ficamos tranquilos». Mas, prosseguiu, «eu questiono-me: onde está o Senhor, ali? Pensei que este pecado fosse contra o Senhor? “Ah, não me veio à mente”». Contudo «não é uma mancha que deves limpar, se fosse uma mancha seria suficiente ir à lavandaria e fazer-se limpar». Ao contrário, explicou o Papa, «o pecado é uma relação de rebelião contra o Senhor: é mau em si, é mau contra o Senhor que é bom». Então «se penso assim nos meus pecados, em vez de entrar em depressão tenho aquele grande sentimento: a vergonha, a desonra da qual fala o profeta Baruc». Porque «a vergonha é uma graça: sentir vergonha diante do Senhor».

Eis então a proposta de fazer um exame de consciência pessoal: «Ninguém responda, mas sim, responda no coração: vós sentistes vergonha diante do Senhor, pelos vossos pecados? Pedistes a graça da vergonha, a graça de se envergonhar diante de ti, Senhor, porque te fiz isto? Porque eu sou mau: cura-me, Senhor». E «que o Senhor nos cure a todos» desejou o Papa, recordando que a vergonha «abre a porta à cura do Senhor».

Por seu lado, prosseguiu Francisco, «o que faz o Senhor»? Faz o que pedimos na oração da coleta no início: “Senhor, Tu que revelas a tua onmipotência, sobretudo com a misericórdia e com o perdão”». Por conseguinte, «quando o Senhor nos vê assim» devemos «envergonhar-nos daquilo que fizemos e com humildade pedir perdão: ele é onmipotente, purifica, abraça-nos, acaricia-nos e perdoa-nos». Mas «para chegar ao perdão o caminho é o que o profeta Baruc nos ensina hoje».

«Louvemos hoje o Senhor — foi a exortação do Papa — porque quis manifestar a omnipotência precisamente na misericórdia e no perdão; depois, também na criação do mundo, mas ela é a segunda». E «sobretudo na misericórdia e no perdão e diante de um Deus tão bondoso, que tudo perdoa, que tem tanta misericórdia, peçamos a graça da vergonha, de nos envergonhar; a graça de sentir desonra». Como escreve Baruc, «ao Senhor nosso Deus, a justiça; a nós, a desonra, ou seja, a vergonha». E «com esta vergonha, aproximar-se d’Ele que é tão omnipotente na misericórdia e no perdão».

 



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