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XV SESSÃO DA COMISSÃO PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DISCURSO DE D. CELESTINO MIGLIORE OBSERVADOR PERMANENTE DA SANTA SÉ NA ONU
Nova York, 10 de Maio de 2007
Senhor Presidente Enquanto a minha delegação se congratula com Vossa Excelência e com os seus colaboradores pela sua eleição, formula votos sinceros a fim de que todas as nossas delegações trabalhem com a maior flexibilidade para realizarmos o máximo que pudermos nas políticas do corrente ano. O debate durante esta sessão e o trabalho da comissão preparatória e a Comissão sobre o Desenvolvimento Sustentável (CSD) relativa ao ano passado demonstraram a natureza extremamente entrelaçada dos quatro temas escolhidos para este ciclo, e o modo como eles podem ter amplas repercussões a nível de segurança nacional e internacional e na capacidade de a comunidade internacional enfrentar seriamente os problemas da pobreza e os empreendimentos das Finalidades de Desenvolvimento do Milénio (MDGs). As interligações tornam-se ainda mais vigorosas, se considerarmos que, em última análise, a terra é a nossa herança comum e temos uma grave e profunda responsabilidade diante de nós mesmos e em relação às gerações vindouras, pelas acções que somos chamados a realizar aqui. É preciso recordar também que a necessidade de uma acção conjunta no plano internacional não diminui de modo algum a responsabilidade dos Estados, assumida individualmente. Senhor Presidente A questão da energia está a tornar-se rapidamente uma das problemáticas-chave de toda a agenda internacional, enquanto todos nós estamos a esforçar-nos para formular uma estratégia energética conjunta e global duradoura, capaz de satisfazer as legítimas exigências de energia a curto e médio prazo, assegurando assim a segurança energética, a salvaguarda da saúde humana e do meio ambiente, e definindo compromissos específicos para abordar as questões relativas à mudança climática. A evidência científica do aquecimento planetário e do papel da humanidade no aumento dos gases que provocam o efeito estufa torna-se cada vez mais inquestionável, como estão a sugerir as descobertas do Painel Intergovernamental sobre as Mudanças Climáticas (IPCC); e tal actividade tem uma profunda relevância, não apenas para o meio ambiente, mas também a níveis ético, económico, social e político. As consequências das mudanças climáticas estão a ser sentidas não somente no meio ambiente, mas em todo o sistema socioeconómico e, como denotam as descobertas contidas em numerosos relatórios já disponíveis, irão influenciar em primeiro lugar e acima de tudo sobre as pessoas mais pobres e mais frágeis que, não obstante estejam entre os indivíduos menos responsáveis pelo aquecimento planetário, contudo são os mais vulneráveis porque dispõem de recursos limitados ou porque vivem em regiões de maior risco. Podemos ver um exemplo disto, entre diversos outros, nas Pequenas Ilhas-Estados em Desenvolvimento (SIDS). Muitas das sociedades mais vulneráveis, que já estão a enfrentar problemas energéticos, dependem da agricultura, precisamente o sector que, com toda a probabilidade, mais sofrerá por causa das mudanças climáticas. Deste modo, em vista de abordarmos o duplo desafio apresentado pelas mudanças climáticas e pela necessidade de recursos energéticos que sejam cada vez maiores, teremos que permutar o nosso presente modelo da busca precipitada do crescimento económico em nome do progresso, por um modelo que preste atenção às consequências das suas acções e tenha mais respeito pela Criação que pertence a todos nós em conjunto, acompanhado de um desenvolvimento humano integral em vantagem das gerações do presente e do futuro. A complexidade da promoção do desenvolvimento sustentável salta aos olhos de todos; contudo, existem determinados princípios subjacentes, que podem orientar para a investigação rumo a soluções adequadas e duradouras. A humanidade deve tornar-se cada vez mais consciente dos vínculos entre a ecologia natural, ou o respeito pela natureza, e a ecologia humana. A experiência demonstra que o desrespeito pelo meio ambiente prejudica a coexistência humana enquanto, ao mesmo tempo, se torna mais evidente que existe um vínculo positivo que se deve estabelecer entre a paz com a criação e a paz entre as nações. Não há muito tempo, o Conselho de Segurança realizou um encontro para debater sobre a relação entre a energia, a segurança e o clima. Embora nem todos concordem que se discutam tais matérias no contexto do Conselho de Segurança, o facto grave é que já estamos a testemunhar a existência de lutas pelo controle de recursos estratégicos, como o petróleo e a água potável, que estão a tornar-se cada vez mais escassos. Se rejeitarmos construir economias sustentáveis no presente, continuaremos a caminhar rumo a maiores tensões e conflitos pelos recursos, sem mencionar aqui a ameaça contra a própria existência as populações litorâneas e as pequenas Ilhas-Estados. Recentemente, ouvimos falar de economias que conseguiram progredir, reduzindo na realidade o próprio consumo de energia. Sem dúvida, este resultado faz esperar que o nosso presente modelo de economia nem sempre exija de nós um uso crescente de energia para poder crescer. O desenvolvimento económico não deve significar um maior consumo. Não obstante, sob o ponto de vista de uma economia sustentável, significa que realmente teremos necessidade da tecnologia, da capacidade, de uma vontade política firme e do bom senso. Naturalmente, isto exigirá também a transferência da tecnologia para os países menos desenvolvidos, para o benefício de toda a comunidade mundial. Contudo, somente a tecnologia, a transferência da mesma e a vontade política de colaborar a nível internacional não são suficientes: a tudo isto, temos o dever de acrescentar ainda programas nacionais de educação que levem todos nós, sem qualquer excepção, a abordar os nossos padrões quotidianos de consumo e de produção de uma maneira muito diferente, e inclusive a exigir uma transformação análoga e total nos sectores da construção, do transporte, do comércio e de outras instituições. Através de tal educação, os Estados podem ajudar os seus cidadãos a compreender a urgência daquilo que se deve levar a cabo, ensinando-os por sua vez a esperar e a exigir uma abordagem realmente diferente do seu próprio consumo e do que se verifica ao seu redor. No mundo inteiro, mudanças ecológicas sem precedentes já estão a realizar-se, e nenhum de nós consegue prever plenamente as consequências da actividade industrial do homem ao longo dos últimos séculos. As soluções não estão além da nossa capacidade; contudo, deveríamos ter o cuidado de não escolher um percurso que piore a situação, de modo especial no que diz respeito aos pobres. Não podemos simplesmente desinventar o mundo moderno, mas ainda há tempo para recorrer à tecnologia e à educação em vista de promover o desenvolvimento universalmente sustentável, antes que seja demasiado tarde. Obrigado, Senhor Presidente!
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