SECRETARIA DE ESTADO CARTA DO CARDEAL ANGELO SODANO 3 de Abril de 1997
Senhor Reitor Tenho o grato prazer de lhe transmitir também este ano, por ocasião da Jornada pela Universidade Católica do Sagrado Coração, a expressão da estima e do afecto que o Santo Padre nutre por essa prestigiosa Instituição, orgulho da Igreja italiana. Nos seus setenta e cinco anos de vida, há pouco celebrados, ela registrou um contínuo crescimento de estruturas e propostas académicas, fazendo-se amplamente apreciar pela comunidade científica nacional e internacional. Ao mesmo tempo, soube ter fé na sua inspiração cristã e caracterizou-se pelo seu sentido eclesial, consciente da missão específica que é chamada a cumprir no empenhativo campo da relação entre fé e cultura. Não causa maravilha, portanto, que ela se sinta fortemente interpelada pelas linhas pastorais, traçadas pela Conferência Episcopal Italiana no recente Encontro Eclesial de Palermo, e as torne objecto de atenção especial no tema escolhido para a anual Jornada da Universidade: «Investir na cultura ÂÂ no projecto cultural da Igreja italiana». É um tema que, enquanto evoca a urgência de imprimir um renovado impulso ao empenho cultural dos católicos, no actual momento histórico da sociedade italiana, põe em evidência o irrenunciável e fecundo ligame que une a Universidade Católica à vida da Igreja. É no enraizamento eclesial que a Universidade, longe de limitar a sua liberdade, encontra antes linfa vital, haurindo dela orientações, critérios e apoio, para viver em plena coerência com a sua inspiração originária. Por sua vez, como o Santo Padre teve ocasião de recordar na Constituição Apostólica sobre as Universidades católicas Ex corde Ecclesiae, ela é chamada a oferecer um específico serviço à Igreja local, ajudando-a «a alcançar um melhor conhecimento das diferentes culturas, a discernir os seus aspectos positivos e negativos, a acolher os seus contributos autenticamente humanos e a desenvolver os meios, com os quais poderá tornar a fé melhor compreensível aos homens duma determinada cultura» (n. 44). A Universidade Católica apresentase, nesta luz, como um grande «observatório » ao serviço do discernimento eclesial. Mas, antes ainda, é chamada a ser, por assim dizer, um «laboratório» do diálogo entre Evangelho e cultura, conjugando uma forte consciência da identidade cristã e uma cordial abertura a todas as sementes de verdade, espalhadas no mundo pelo Espírito de Deus. Por isso, é para ela qualificante ter em vista constantemente aquele objectivo científico e pedagógico, a que o mencionado documento pontifício chama «integração do conhecimento». Isto implica não só o diálogo interdisciplinar, hoje mais do que nunca necessário na investigação científica, mas também a colocação das diversas disciplinas no horizonte duma autêntica antropologia cristã, ou seja, «no quadro duma visão da pessoa humana e do mundo, iluminada pelo Evangelho e, portanto, pela fé em Cristo-Logos, como centro da criação e da história humana» (ibid, n. 16). Desta síntese cristocêntrica, na óptica amplamente desenvolvida pelo Concílio na Gaudium et spes (cf. nn. 22, 32 e 45), não se deve temer prejuízo algum à autonomia legítima de cada uma das disciplinas, enquanto haure vantagem segura a formação científica e profissional, oferecida na linha de um projecto educativo no qual a experiência de fé se insere de modo harmonioso no processo de desenvolvimento integral da pessoa. A Universidade Católica do Sagrado Coração teve sempre viva esta consciência programática. É imperioso reconhecê- lo, com espírito de profunda gratidão ao Senhor e a todos os que despenderam energias de inteligência e de vida para o seu crescimento e o seu progresso. É esta, aliás, a orientação inscrita no projecto originário, elaborado pelo Instituto Giuseppe Toniolo de Estudos Superiores, entidade fundadora e promotora da Universidade Católica, à qual era pedido, desde o início em via permanente, que garantisse o prosseguimento das finalidades institucionais do Ateneu (cf. Estatuto, art. 2). Não é por acaso que a Universidade Católica do Sagrado Coração, nascida da inteligência clarividente do Padre Agostino Gemelli, evoca idealmente também a figura do Venerável Giuseppe Toniolo, que há um século, num período não fácil para a Igreja e a sociedade na Itália, se distinguiu pela promoção duma série de fecundas iniciativas culturais ÂÂ dir-se-ia, em termos hodiernos, de um «projecto cultural» ÂÂ dando vida, entre outras, à «Sociedade Católica Italiana para os Estudos Científicos », na qual o próprio Pe. Gemelli reconheceu o longínquo gérmen da futura Universidade Católica. No empenho do diálogo entre fé e cultura, que se tornou hoje talvez mais árduo, pode servir de grande estímulo, para professores e alunos da Universidade, inspirar-se em concretos modelos de «santidade laical », redescobrindo com interesse renovado também a bonita figura do professor de Treviso, que exerceu um papel tão representativo entre os católicos italianos do seu tempo. Ele continua a ser um exemplo vivo de como se podem harmonizar, na concretitude da vida familiar e profissional, contemplação e acção, intensa comunhão eclesial e empenho vigoroso pelo progresso da ciência e a transformação da sociedade, à luz do Evangelho. Estou certo, Senhor Reitor, de que a Universidade Católica do Sagrado Coração, em todas as suas componentes ÂÂ professores, alunos, pessoal de toda a ordem e grau ÂÂ quer mover-se dentro deste horizonte ideal, advertindo profundamente a responsabilidade de o traduzir em coerente testemunho de cultura e de vida. Faço votos, por isso, que os católicos italianos honrem também este ano a nobre tradição de assegurar oração e apoio concreto a essa benemérita Instituição, enquanto de bom grado transmito, com o dom anexo, a propiciadora Bênção Apostólica que o Santo Padre lhe envia, Senhor Reitor, e à inteira comunidade académica. Uno a minha saudação pessoal e aproveito a circunstância para me confirmar, com sentimentos de distinta estima. Seu dev.mo no Senhor
Ângelo Card. SODANO
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