CONGREGAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO CATÓLICA HOMILIA DO CARDEAL GROCHOLEWSKI 1 de Abril de 2004
Excelências Estou feliz por me encontrar aqui nesta comunidade e presidir à Celebração eucarística por ocasião do 70º aniversário da fundação deste Pontifício Colégio Pio Brasileiro em Roma. Agradeço ao Rev.mo Reitor o gentil convite. Vós bem sabeis como está a peito à Congregação para a Educação Católica o Colégio eclesiástico da vossa grande e amada Nação, na Cidade Eterna da Igreja. A primeira pedra deste Colégio foi colocada pelo Cardeal Gaetano Bisleti, então Prefeito da Congregação chamada "dos Seminários e das Universidades de Estudos", e também ele, há setenta anos, presidiu à inauguração do Vosso Colégio. Esta Casa foi visitada tanto pelo Papa Paulo VI (em 1964) como por João Paulo II (em 1982). Então, é oportuno que eu tenha vindo hoje para participar da vossa alegria pelo septuagésimo aniversário, ainda mais porque na fundação do Colégio colaborou também um meu eminente compatriota, Padre Vladimiro Ledóchowiski, Prepósito-Geral da Companhia de Jesus. Não passam depercebidos os reflexos benéficos deste Pontifício Colégio para a Igreja no Brasil, mas também para a Igreja universal. Nele quase 1700 sacerdotes foram ajudados a completar os estudos de especialização, e mais de 100 receberam a Ordenação episcopal, entre os quais três são Cardeais. Muitos tornaram-se professores e formadores nos Seminários brasileiros, nas Faculdades eclesiásticas, como também noutros Institutos superiores de Teologia ou de matérias afins, enriquecendo a Igreja que está no Brasil com a sua ciência e visão universal da mensagem evangélica que respiraram na Cidade Eterna. O problema fundamental da fé A hodierna solenidade da Anunciação, sugere-me que chame a atenção sobre um elemento de importância fundamental para a vossa formação sacerdotal a fé. De facto, o Evangelho que escutámos diz respeito sobretudo à fé de Maria. A minha reflexão basear-se-á de modo especial nas perspicazes considerações da Encíclica de João Paulo II Redemptoris Mater (23 de Março de 1987), nn. 12-19. A fé foi um elemento essencial da vida de Maria, graças ao qual Ela pôde realizar de maneira esplêndida o importante papel que lhe foi confiado por Deus na história da salvação. Também para a nossa vida espiritual, a fé é um elemento essencial, do qual depende se e em que medida cada um de nós será capaz de realizar a tarefa que nos foi confiada pelo Senhor. Na Encíclica e esta é a constatação fundamental a esse respeito João Paulo II realça que Maria se tornou realmente presente no mistério de Cristo, precisamente porque acreditou, ou seja, porque respondeu com generosidade e com a obediência da fé ao dom de Deus. De facto, a fé é entendida aqui como "a obediência da fé", da qual fala São Paulo (Rm 16, 26); como um abandono completo e livre a Deus; como plena adesão do intelecto e da vontade à mensagem de Deus, mesmo se não é totalmente compreensível; portanto, uma entrega confiante à palavra de Deus mais do que ao próprio intelecto. A Anunciação A resposta de fé, ou seja, a obediência da fé de Maria, demonstra todo o seu poder na cena da anunciação descrita por Lucas no Evangelho de hoje (1, 26-38). Foi um momento decisivo para Maria. O anjo do Senhor anuncia as palavras do Deus vivo "Hás-de conceber no teu seio e dar à luz um filho". Trata-se de um momento crucial em toda a história da salvação. De facto, a resposta de Maria teve uma importância ingente ao acolher este anúncio, Ela tornou-se Mãe do Senhor; teve lugar a encarnação do Filho de Deus, o nascimento do Salvador do mundo. E Maria responde "Eis a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra". Este "faça-se em mim", este fiat de Maria, decidiu pelo lado humano a tarefa do mistério divino. É óbvio que, Maria pronunciou este fiat mediante a fé ela não era capaz de penetrar no anúncio misterioso de Deus, nem de entender todo o conteúdo do mistério a propósito do qual expressou o seu "faça-se em mim", contudo abandonou-se a Deus sem reservas, confiou completamente n'Ele. Precisamente por isso, a fé de Maria pode ser comparada à de Abraão, chamado "o nosso pai na fé" (cf. Rm 4, 12). Pode ser comparada, ou melhor, a fé de Abraão é uma figura da fé de Maria. Como Abraão, de quem São Paulo diz que "foi com uma esperança, para além do que se podia esperar, que ele acreditou e assim se tornou pai de muitos povos" (Rm 4, 18), não obstante fosse já muito idoso e sua mulher, Sara, fosse estéril; assim Maria, no instante da anunciação, acreditou que embora conservando a virgindade se tornaria, pelo poder do Altíssimo, a mãe do Filho de Deus, segundo a revelação do anjo. Depois, poderia Maria ter intuído qual era o significado essencial das palavras do anjo que aquele Filho "será grande e chamado Filho do Altíssimo", e que "o Senhor lhe dará o trono de David, seu pai, e reinará para sempre sobre a casa de Jacó e o seu reino não terá fim"? Maria simplesmente se abandonou ao Senhor. Portanto, durante a visita, Isabel cheia de admiração exclama de Maria "Feliz de ti que acreditaste, porque se vai cumprir tudo o que te foi dito da parte do Senhor" (Lc 1, 45). João Paulo II nota que entre todas as palavras densas de significado, ditas então por Isabel, aquelas finais "Feliz de ti que acreditaste" têm uma importância fundamental, porque, graças a esta resposta de fé, Maria como disse anteriormente "tornou-se realmente presente no mistério de Cristo"; e, acrescento, tornou-se presente no mistério da Igreja e na vida de cada um de nós. Caminho da fé de Maria A anunciação, como já observei, é o ponto culminante da fé de Maria na expectativa de Cristo, mas é também o ponto de partida de todo o caminho da fé de Maria. Neste caminho observa a Encíclica Redemptoris Mater a obediência da fé por parte de Maria actuará de modo cada vez mais heróico. Ao longo da sua vida terrena, Ela confirmará o seu fiat, isto é, confirmará que como Abraão "foi com uma esperança, para além do que se podia esperar, que ele acreditou", abandonar-se-á sempre, humildemente e com o coração aberto, aos imperscrutáveis juízos do Senhor. Neste caminho da obediência da fé, Ela ouvirá as palavras de Simeão no templo em Jerusalém "Este menino está aqui para queda e ressurgimento de muitos em Israel e para ser sinal de contradição, uma espada trespassará a tua alma" (Lc 2, 34-35). Estas palavras parecem água fria sobre quanto Maria tinha ouvido durante a anunciação "Será grande e chamado Filho do Altíssimo; o Senhor lhe dará o trono de David, seu pai, e reinará para sempre". Tudo começa a apresentar-se sob uma nova luz. Mostram-se, então, para o seu Filho e para Ela a incompreensão e a dor. Todavia, podia Maria entender tudo isso? Mas ela aceita com fé. Em seguida, a fuga para o Egipto, porque Herodes estava procurando o menino para o matar (Mt 2, 23), e o sofrimento inerente a tal situação. Porventura, não era tudo isso para ela um mistério não facilmente compreensível? Mas, ela acredita, como Abraão, para além do que se podia esperar. E os longos anos da vida escondida, não foram também cheios de mistério? Jesus comporta-se como qualquer menino e rapaz. Mas, Maria sabe que ele foi chamado pelo anjo "Filho do Altíssimo", que o concebeu "sem conhecer homem", por obra do Espírito Santo, etc. Portanto, Maria vive, mediante a fé, quotidianamente em contacto com o inefável mistério de Deus, o mistério que a supera. Não conhece plenamente o Filho. De facto, "ninguém conhece o Filho senão o Pai" (Mt 11, 27). Para Ela o Filho é um mistério. Maria, então, "está em contacto com a verdade do seu Filho só na fé e através da fé! [...] e acredita todos os dias, apesar das provas e contrariedades do período da infância de Jesus e depois durante os anos da vida escondida em Nazaré". Neste contexto, a cena da descoberta no templo de Jerusalém (Lc 2, 41-52) é também muito significativa. À pergunta de Maria e José "por que nos fizeste isto"? Jesus, com 12 anos, responde "Não sabíeis que devia estar em casa do meu Pai?". E o Evangelista acrescenta "Mas eles não compreenderam as palavras que lhes disse". Sim, Jesus era um mistério também para Maria e ela vivia na intimidade deste mistério mediante a fé, dia após dia. Assim, foi também durante toda a vida pública de Jesus. A heroicidade da fé de Maria alcançou o seu pleno significado quando estava aos pés da cruz de Jesus. Durante a anunciação, Maria ouviu "Será grande [...] o Senhor lhe dará o trono de David, seu pai, e reinará para sempre". Aos pés da Cruz "Maria é testemunha, humanamente falando, da completa contradição destas palavras" o seu Filho agoniza, condenado, desprezado, coroado de espinhos, zombado, abandonado até pelos próprios discípulos. Mas, Maria, assim como acreditou durante a anunciação, acreditou também agora. Aliás, mediante a fé está perfeitamente unida com Cristo no mistério da sua espoliação, participa da morte redentora do Filho. "Feliz de ti que acreditaste!" João Paulo II nota que "estas palavras, ponunciadas por Isabel depois da anunciação, aqui, aos pés da Cruz, parecem ecoar com suprema eloquência, e o poder nelas contido torna-se penetrante. Da cruz [... aquela bênção de fé] remonta "até ao início" e [...] torna-se, num certo sentido, o contrapeso da desobediência e da incredulidade, presentes no pecado dos progenitores". Conclusão Quanto heroísmo no caminho da fé de Maria! E quantos frutos magníficos desta sua fé! De facto, graças a esta fé, Deus habitou intensamente n'Ela e fez grandes coisas n'Ela e por Ela (cf. Lc 1, 49). Deveras, "Feliz de ti que acreditaste"! Toda a humanidade deveria agradecer Maria e louvá-la pela sua fé. Porém, esta fé de Maria é também para cada um de nós uma admirável lição. Ensina-nos, encoraja-nos e interpela-nos constantemente. Caríssimos Moderadores, Colaboradores, Estudantes, Hóspedes, Deus pode estar intensamente presente também na vossa vida. O Senhor pode verdadeira e frutuosamente habitar no meio de vós, no vosso Colégio e nos vossos corações. Através de vós, Deus pode fazer coisas maravilhosas para a vossa salvação e do mundo inteiro, mas dependerá em grandíssima parte da vossa fé, se e em que medida sabereis demonstrar a Deus a obediência da fé; se e em que medida sabereis confiar-vos no Senhor; submeter o vosso intelecto e a vossa vontade aos imperscrutáveis juízos de Deus, nas diversas circunstâncias do vosso caminho, sobretudo quando o imperativo da fé parecer imcompreensível e contrário aos vossos cálculos humanos. Cada um de nós é responsável pela própria fé, pelo seu crescimento ou a sua diminuição. Que contemplando a fé de Maria cresça a nossa. Estes são também os meus afectuosos votos hoje para todos vós.
|
|